Estava ansiosa para começar a escrever sobre a viagem à Índia que fiz entre o final de outubro e início de novembro de 2019 para comemorar o meu aniversário de 50 anos.

A viagem durou 9 dias inteiros. Comecei por New Delhi (1 dia) fui de avião para Udaipur (2 dias) e depois todos os outros deslocamentos de carro: Jodhpur (2 dias), Jaipur (2 dias), Agra (1 dia) e novamente New Delhi (1 dia). Ranakpur e Pushkar foram visitas (paradas) no meio do trajeto entre as cidades. Foram 1.000 km por terra. Contratei a agência Pioneer Journeys (www.viajarparaindia.com) e fiquei muito satisfeita com o serviço. Tour privativo com motorista e guia (em espanhol), entregaram exatamente o que foi contratado. Seriedade e profissionalismo.
Eu adorei a Índia! Mesmo com vários pontos negativos (já vou falar sobre eles) foi uma viagem espetacular, me sentia como em um filme! Não vou recomendar a Índia para você caro leitor pelo fato de que é um destino muito pessoal, tem que ter perfil, estudar muito, se preparar psicologicamente e acho necessário o suporte de uma boa agência. Guardo na memória lembranças maravilhosas dessa viagem, não sei se um dia irei voltar, acho que está visto, mas quem sabe o que a vida nos reserva? Não digo “nunca mais” para a Índia.

Fiz uma viagem turística, não fui a procura da Índia espiritual. Sou católica e uma religião que tem milhões de deuses, um com cabeça de macaco, outro com cabeça de elefante mais um com quatro cabeças e quatro braços, não me diz nada. Respeito como espero que respeitem a minha crença. Também não pratico ioga ou meditação. A “energia” que dizem haver lá eu sinceramente não senti. Mas, friso novamente, embora tenha conhecido cidades e templos sagrados, não fiz um roteiro espiritual.

Achei a comida horrível, mesmo não sendo vegetariana gosto muito de legumes e vegetais, por não ter carne de boi, comi cordeiro e frango. Também gosto de comida apimentada, só que lá é pimenta pura. Quando se pede sem o condimento não tem gosto. Então, por exemplo, arroz temperado com vegetais, um prato muito comum, para mim foi impossível, a boca chegava a formigar, comi mal, até emagreci. Adoro peixe e frutos do mar, minha principal opção em viagens só que os rios na Índia são poluídos e os produtos importados não são armazenados corretamente, o risco de contaminação é alto, não é seguro comer esses alimentos. Fiquei muito mal humorada neste quesito, poucos foram os locais em que a comida agradou.
Abaixo prato com arroz e vegetais e frango, se não fosse a quantidade absurda de pimenta estaria bom. A entrada neste restaurante foi o único prato que eu realmente gostei, um queijo grelhado com vegetais e pimenta claro.

Tive uma preocupação neurótica com a higiene. Tinha muito medo de ficar doente e não conseguir aproveitar os passeios. Medo de pegar uma bactéria, passar mal, morrer, enfim, a gente lê tanta barbaridade que fica apavorada, não tinha coragem de comer nada dos buffets, inclusive de café da manhã nos hotéis que eram bem fartos e variados. Meu café da manhã se resumia a chá preto com pão e manteiga. O marido tomou suco de laranja e comeu ovos fritos. Não tive coragem. Frutas nem pensar. É preciso ter em mente que a água na Índia é contaminada, então precisa ter muito cuidado.
Como estava sempre com fome comprava nos paradores da estrada pacotes de bolacha, batata chips, chocolate, coca cola e suco em caixa ou lata. Nunca comi tanta “porcaria” em viagem como na Índia.

Em relação a prevenção o que eu fiz: 1) Só escovei os dentes com água mineral 2) Só tomava água mineral, principalmente com gás, coca cola e vinho 3) Gelo nem pensar 4) Carne de boi, não tem e nem pensar 5) Peixe e frutos do mar, de jeito nenhum 6) Não consumi frutas, sucos e nem ovos 7) Nada de drinks 8) Passava álcool gel nas mãos 200 vezes por dia. 9) Levei uma mala de remédios: principalmente antibiótico e probiótico (tomava um por dia). Assim, não tive nenhum problema, nenhum piriri, NADA! Também, com todas essas restrições e precauções tinha graça acontecer alguma coisa não é mesmo?
A poluição estava a pior dos últimos 20 anos, em New Delhi e Agra a níveis absurdos. Difícil respirar, enxergar e apesar de não ser época de chuva e o dia ser ensolarado, não era possível ver um céu azul porque estava sempre branco ou cinza, o que também compromete a beleza das fotos, já que não há o contraste do céu azul que deixa tudo mais bonito. No primeiro dia em New Delhi o marido já se sentiu mal, não conseguia respirar. Eu só me senti mal no penúltimo dia, em Agra, não sei o que eu tive. Era um cansaço extremo, dores nas costas, dificuldade para respirar, olhos ardendo, tudo ocasionado pelo ar que os indianos chamam propriamente de “contaminação”, eles tem razão, o ar é muito contaminado.

A miséria e a sujeira são realmente absurdas, como eu comentei, fiz todo um trabalho psicológico para enfrentar. É muito triste sim, principalmente quando se vê crianças em situações tão adversas. Na Índia as crianças não são obrigadas a estudar, trabalham em serviços pesados e vivem pelas ruas mendigando. O marido ficou sensibilizado. Da minha parte procurei pensar que estava conhecendo uma cultura muito diferente. Não fui para julgar. Tem que tentar abstrair. Se absorve é uma indignação que nos faz mal e infelizmente não temos o que fazer.
Em uma das situações, com o carro parado em um semáforo, crianças se aproximaram da janela para pedir dinheiro e eu dei, o guia me orientou a nunca mais fazer isso, que as crianças são usadas, o dinheiro não fica para elas, enfim, é muito difícil de lidar.
Abaixo um mercado de compras (comida e roupas) em Jodhpur. Lixo por todos os lados
Os indianos me passaram a impressão de que são pessoas tranquilas, pacientes e felizes. Acho que eles pensam que a vida é assim mesmo e pronto, não tem o nosso inconformismo. Possuem uma fé e resignação impressionantes. O sistema de castas que não está mais em vigor, mas culturalmente ainda existe, “ajuda” nessa percepção de que na vida você nasce, cresce e morre na mesma situação. Ascensão social é praticamente inexistente.

Outra coisa é a adoração que eles tem pelos marajás. Embora tenham sido extintos os seus poderes ainda exercem muita influência nas suas cidades. E porque “dão hospital, escola ou comida” o povo os idolatra. O que para nós é esmola, eles acham generosidade, algo realmente muito importante na Índia.
E por falar nos Marajás, o nome do roteiro da viagem era: os Palácios do Rajastão. Fiquei hospedada em Udaipur, Jodhpur e Jaipur em palácios que foram as residências dos marajás, administrados pela rede Taj Hotels. Inclusive em Jodhpur o marajá ainda vive lá com a sua família em uma parte do palácio. A beleza e riqueza das construções impressionam e contrastam com a realidade do seu povo.







O trânsito é exatamente como se vê no cinema, completamente louco! Aliás, regras de trânsito não são lá muito seguidas na Índia. Andar na contramão, por exemplo, cansei de ver, às vezes fechava os olhos e pedia Deus me ajude e ajudava porque não aconteceu nada. Buzinar faz parte do ato de dirigir. Não existe alguém dirigir na Índia sem buzinar, algumas vezes sem a menor necessidade, mas pode aparecer algo eles devem pensar, porque vivem com a mão na buzina. No início é muito engraçado, depois vai ficando atordoante.
Mesmo assim, vemos coisas tão incríveis pelo caminho que compensa.




New Delhi tem 26 milhões de habitantes e eu não fiquei parada em nenhum engarrafamento. Na minha cidade, Florianópolis, de 500.000 habitantes SÓ tem congestionamento. Daí você pode pensar que por ser uma cidade pobre tem poucos carros, mas não é isso, acredito que esse sistema de trânsito “sem regras” acaba ajudando o trânsito a fluir e os milhares de tuc tucs também ajudam a desafogar o trânsito. Nos 9 dias que passei na Índia só vi duas batidas de carro. Mais uma vez comparando, na minha cidade tem todo dia.
Nós somos verdadeiros ETs para eles. E por sermos criaturas tão diferentes os indianos pedem fotos o tempo todo, querem ter um registro para guardar, mostrar para a família ou publicar em redes sociais “sua amiga estrangeira”. Me senti uma celebridade! Em alguns momentos o “assédio dos fãs” era tão grande que chegava a incomodar hahahaha. Para quem tem baixa auto estima é o paraíso. Inclusive se você anda se sentindo feia, gorda ou velha (como eu) vá para a Índia. Lá eu me senti a última bolacha do pacote 😉 A felicidade das crianças que vinham correndo pedindo “photos please” era demais!


Só um detalhe: eu fazia fotos com crianças, jovens meninas, mulheres, famílias e casais. Com rapazes não, dizem que eles aproveitam o momento para “passarem a mão”. Não aconteceu comigo, só li a respeito, inclusive mulher estrangeira não deve andar sozinha na Índia, não é seguro, independente da idade, há um alto índice de crime de estupro.

Quanto aos outros crimes é muito seguro, furto e roubo não existe.
Depois de relatar tantos pontos negativos se pode pensar: e ela ainda gostou, como? SIM AMEI! Porque conheci lugares tão lindos, tão diferentes. Uma história tão rica com passagens tão fascinantes dignas de roteiro de filme.















Os trajes das indianas – sáris – o colorido de suas roupas me deixavam completamente fascinada, realmente uma explosão de cor e luz. Laranja, Verde, Rosa, Vermelho, tudo muito aceso, muito vivo, alegre. Não vi indianas de branco, preto, bege, cinza ou marrom, cores que são tão tristes. O efeito desses trajes tão elaborados com a arquitetura local era realmente um espetáculo para os olhos.



Conheci um povo muito gentil na sua maioria, doce, amável, preocupado sempre em lhe agradar e se você está bem e feliz. Uns consideram um povo servil, mas a servidão tem a conotação que você quiser dar. Na Índia servir é um ato de amor.



Claro que por uma questão de sobrevivência, os indianos esperam uma gorjeta pelo serviço realizado, mesmo que “criem” esse serviço, como quando você pede uma informação na rua, eles não dão a informação e sim te levam até o destino, para quando chegar lá pedir uma gorjeta. Também em relação aos vendedores ambulantes “muito chatos e insistentes”, eles precisam vender, precisam ganhar algum dinheiro para o seu sustento e quem tem dinheiro? Nós os turistas, claro. Com base nisso penso que o desprendimento material, um dos princípios do hinduísmo, soa deslocado da realidade, pois a necessidade de ter alimento, vestuário e moradia implica obrigatoriamente em conseguir dinheiro para a sua aquisição, sonho de todos.

Logo na chegada me chamou a atenção a forma como é feita a imigração no aeroporto Indira Gandhi em New Delhi. Turistas voando de primeira classe e executiva tinham guichês separados, com tapete vermelho e corrimão dourado. Não demorei mais do que 10 minutos na fila. A diferença “entre classes sociais” já é flagrante na entrada. Ao lado o espaço para a classe econômica, uma fila imensa que demora horas, porque além de ter muito mais passageiros é junto com quem faz o visto eletrônico pela internet, na realidade se trata de uma solicitação de visto, cuja análise dos requisitos é feita lá.
Recomendo fazer o visto impresso no passaporte no Consulado da Índia. Necessário entrar no site do consulado para ver o local da sua região. Como moro em Santa Catarina o meu consulado foi em São Paulo. A entrada no país desta forma é muito mais rápida.
O aeroporto Indira Gandhi em New Delhi – minha porta de entrada e saída – é limpo, organizado e muito bonito, me causou uma ótima impressão. O sistema de segurança e RX é mais rígido, o mesmo que vi na Turquia.

A Índia possui 1 bilhão e 350 milhões de habitantes em um território que corresponde a 1/3 do Brasil. Conseguem imaginar, mesmo com a nossa extensão territorial, o nosso país com 1 bilhão e 150 milhões de habitantes a mais? E na Índia a coisa flui, apesar de tudo, de maneira ordeira e pacífica, um feito realmente extraordinário de pessoas que são “da paz” e “do bem”. O único problema é querer uma foto exclusiva nas atrações! O forte do turismo na Índia são os próprios indianos, o turismo interno.

O cumprimento ou saudação Namastê – é feito por todos na chegada e na partida, com as mãos juntas esticadas com os dedos para cima pressionadas ao peito e o corpo ligeiramente curvado em reverência que possui significados como: eu saúdo a você, meu respeito a você e o divino em mim reconhece o divino em você. Sinal de um povo que tem uma atenção e preocupação enorme com o bem estar do outro.

Atenção que se estende a todos os seres vivos, fundamento do veganismo. Os hindus tem um profundo respeito pelos animais em especial a vaca, considerada sagrada, que transita livremente pelas ruas e de maneira geral os indianos não consomem e não utilizam produtos de origem animal. Os mais ortodoxos usam máscaras para não correr o risco de engolir algum inseto voador e usam vassouras para varrer na frente de seus passos para não pisar em algum animal, como formigas por exemplo.

Em alguns templos é proibido entrar usando qualquer produto de origem animal: cintos e bolsas de couro por exemplo. Comprei na Índia algumas bolsas de tecido para esse fim. E sempre sem sapatos por uma questão de respeito ao solo sagrado.

E a maior lição que a Índia me deixou foi a BOA VONTADE. Os indianos fazem tudo com muito boa vontade e então eu me senti envergonhada por todas as vezes que tive preguiça ou má vontade para fazer algo. A disposição deles é incrível! O marido diz que é a luta pela sobrevivência, a necessidade que os faz assim. Pode ser, mas assim mesmo é uma lição. Nunca dizer NÃO, dar um jeito sempre de fazer o que o outro pede, estar sempre com um sorriso no rosto é realmente inspirador.

Retiro do livro Filosofias da Índia de Heinrich Zimmer, Editora Palas Athena, indicado pelo marido (leitor compulsivo que possui a edição de 1986), a essência do preconceito em relação ao que nos é desconhecido.
“Excluir, rejeitar algo é pecado e auto engano, é a sujeição do todo à parte, é a violência atuando contra a essência e a verdade onipresentes, o finito colocando a si próprio acima do infinito. Aquele que assim se comportar ‘isto é quem assim se comporta como ser humano civilizado’ mutila e abrevia a realidade revelada e consequentemente mutila e abrevia a si mesmo.”
Quando escolhi a Índia para celebrar o meu aniversário pensei em um destino exótico, diferente do que estou acostumada, para sair da “zona de conforto ” e fugir do “lugar comum”. Só não imaginei que seria o aniversário mais incrível da minha vida! Imagens que ficarão para sempre na memória.

Até hoje todos os lugares que eu conheci foram passeios. Para a Índia foi A VIAGEM no seu sentido mais amplo e profundo. Namastê!


Estou hipnotizado com as maravilhosas fotos e encantado com os relatos dessa viagem surreal! Obrigado por compartilhar sua visão da Índia. É realmente um choque cultural. Cada lugar a que vocês foram, cada encontro inusitado e surpresas incríveis que vocês vivenciaram só deixam gravada, na memória e no coração, a beleza e a diversidade da vida! Que venham mais e mais viagens espetaculares como essa!
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Obrigada pelo comentário amigo tão especial, como você! Sim, a viagem para a Índia foi uma experiência muito marcante, achei melhor fazer essa introdução para depois falar sobre cada cidade no seu aspecto turístico. A Índia é um outro mundo e fiquei muito feliz de ter vivenciado isso. Beijos!
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O prólogo muito sutil,com humor natural da autora,tenta quebrar o medo do turista menos avisado.O humor é arma certa para se quebrar preconceitos. Precisa é ter talento como a blogueira faz.Talento e determinação para se vestir e integrar-se com a paisagem e humildade para usar sandálias e sacá-las para adentrar nos templos. As fotos dos Palácios e Monumentos são lindas.Destaque para a foto no Taj Mahal com vestido laranja-vermelho, é capa para a revista Vogue. Os passeios e o povo são verdadeiros e os conceitos são ISENTOS.Ela mostra o que os olhos veem,não em que você acredita! A Índia como Nirvana são para os escolhidos,não para todos.Como epílogo:um blog de coragem e verdades para se conhecer a Índia.
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Amigo estou fascinada com os seus comentários, muito obrigada! Agora você precisa usar esse seu talento, estou adorando, vou lhe chamar para ser articulista que tal?
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